Futebol no bar do Mário

11/11/2019
Quando lembro de minha infância, e quando relaciono essa lembrança ao futebol, a primeira imagem que emerge, das profundezas de meus pensamentos, é um jogo que assisti no Bar do Mário Casagrande, próximo da rodoviária, em Redentora.

 O Bar do Mário, que já não existe mais. Ficava localizado, onde hoje, pelo que sei, existem casa de moradias, cheguei a morar no local muitos anos depois.  

Lembro-me com perfeição da época em que ali ainda era um bar, ou pelo menos, com a perfeição que minha mente, então infantil, me permite lembrar.

Tinha uma espécie de área aberta na frente. Com apenas as bases de madeira horizontal que a circundavam. Uma porta grande, creio que de madeira, e um janelão, sempre aberta. 

Na parte interna um balcão tipico de bolicho de um tempo que já se foi, onde as suas pequenas vitrinas, de vidro, permitia à criançada ver as guloseimas apetitosas que ficavam do outro lado. Sobre o balcão havia um baleiro giratório e um vidro com ovo de galinha em conserva, daqueles coloridos, além de uma estufa onde ficavam alguns pastéis e galetos fritos, passados na farinha de trigo. Eram petiscos para acompanhar a cerveja.

Atrás do balcão tinha uma prateleira com diversas garrafas, as geladeiras, os congeladores e o Mário, que estava sempre discutindo com algum cliente por causa de futebol.

Quase no canto que dava para uma porta que levava para dentro da casa, onde Mário morava com a família, no alto, ficava uma televisão, 14 polegadas, de cubo gigante, que na maioria das vezes estava sintonizada na Globo. 

Naquela época, em Redentora, era possível sintonizar três canais de televisão e somente com uma antena espinha de peixe: Globo, SBT e Band. Em alguns pontos, pegava, a já extinta TV Manchete, mas era raro.

1996 era um ano mágico para o Grêmio. A equipe que era treinada pelo técnico Luiz Felipe Scolari, entrava no seu segundo ano de pujança em termos de futebol. A dupla Paulo Nunes e Jardel era uma unanimidade no futebol brasileiro e aquele time jogava um jogo digno de um campeão. 

Minha lembrança de futebol no Bar do Mário veio de um jogo no Campeonato Brasileiro daquele ano. Grêmio e Botafogo, numa tarde de domingo. Na minha vila não havia nenhuma televisão, nem energia elétrica havia, era apenas o velho e bom rádio, onde ouvíamos todos os jogos, acompanhávamos as notícias e até ouvíamos as novelas da globo que podiam ser sintonizadas no aparelho de ondas curtas, mas naquele dia, aproveitamos o descuido das mães e com as chinelas havaianas nas mãos, saímos no meio da tarde para jogar bola num campinho próximo e fugimos para o Bar do Mário para ver o jogo do Grêmio.

O local estava cheio de homens. Todos na parte interna do ambiente bebendo cerveja, falando alto e olhando para a televisão que transmitia em preto e branco. 

Nos empoleiramos no janelão e ficamos nos acotovelando para encontrar espaço para ver o jogo. Como eu era o menor, pouco consegui ver do jogo, mas sempre que olhava só via o Grêmio com a bola. Antes que pudesse me atinar era arrancado do meu espaço e colocado no chão de novo, e ficava tentando, do fundo, ver por entre as cabeças o que estava acontecendo.

 Quando saiu um gol eu comemorei desesperadamente. Era gol do Grêmio. Todo mundo me olhou com o rabo do olho e alguns começaram a me chamar de colorado. Demorei tempo demais para entender que na TV, preto e branco, as camisas de Grêmio e Botafogo eram semelhantes e somente no final do jogo me dei conta que o Grêmio havia perdido por 1 a 0.

Depois do jogo voltamos para casa. Alguns apanharam, outros ficaram de castigo, e eu recebi alguns conselhos de minha mãe Catarina, que nunca me batia, e ganhei um rádio novo,  com fones de ouvido para não fugir mais para assistir o jogo no Mário.

Isso de fato não aconteceria mais, pois, odiei ver o jogo na televisão. Primeiro por não identificar quem era quem, e o mais importante, na televisão o meu Grêmio perdia e no meu rádio era imbatível. Tomei preferência pelo rádio, ainda tenho, e o Grêmio foi campeão Brasileiro daquele ano.